O princípio fundamental da homeopatia, estabelecido por Samuel Hahnemann há mais de dois séculos, é o princípio da similaridade, ou seja, a cura pelo semelhante [1]. Isto significa que, quando os medicamentos homeopáticos são prescritos com base na similitude dos sintomas, eles estimulam os mecanismos de defesa do próprio corpo na luta contra o patógeno ou contra a doença estabelecida [3].
A imunologia, por sua vez, é o estudo do sistema imunológico, cuja função é defender o corpo contra infecções ou doenças e neutralizar as substâncias potencialmente patogênicas [1].
E qual é a relação entre homeopatia e imunologia?
Ambas iniciaram seu desenvolvimento no final do século XVIII. As primeiras vacinas contra a varíola, descobertas pelo médico britânico Edward Jenner, começaram a ser aplicadas ao mesmo tempo em que o médico alemão Samuel Hahnemann conduzia suas primeiras experimentações homeopáticas. Ambos os métodos terapêuticos se baseiam em uma hipótese muito semelhante: o conceito de similaridade, que significa prevenir ou tratar uma doença com um agente que é idêntico ou similar ao que causa a doença [1].
É importante notar que Hahnemann cita as experiências clínicas de Jenner no "Organon". Na sexta edição deste livro, datada de 1842, ele especifica: "fato notavelmente benéfico, que ocorreu desde a distribuição geral da vacina de Jenner, a varíola humana não reapareceu mais epidemicamente e com a virulência de 40-50 anos atrás, quando uma cidade visitada por ela perdia metade, se não dois terços de seus filhos, para a morte causada por esta peste miserável" [4].
Como se sabe, a vacina é produzida a partir do patógeno responsável pela doença a ser prevenida. De forma análoga, o medicamento homeopático é identificado com base na semelhança entre os sintomas causados pela ação subtóxica de uma substância testada em humanos saudáveis e os sintomas da doença a ser tratada. A partir dessa lógica, é possível inferir que a técnica de vacinação pode ser considerada um exemplo de isoterapia, sendo mais parecida com a farmacologia homeopática do que com a farmacologia convencional [1].
Assim, podemos considerar a imunologia como uma ponte entre a homeopatia e a medicina convencional, visto que é um campo onde se pode aplicar conceitos como o efeito de substâncias administradas com base no princípio da "similaridade" e a grande sensibilidade dos sistemas vivos às modulações induzidas por doses ultradiluídas de substâncias naturais ou endógenas [2].
Existe comprovação científica sobre a ação dos medicamentos homeopáticos sobre o sistema imunológico?
Atualmente, há vários estudos que utilizam medicamentos homeopáticos sob condições experimentais bem definidas, com provas produzidas convencionalmente, explicando os fenômenos homeopáticos. A literatura científica atual contém uma série de evidências que podem fornecer novas percepções, melhorando a compreensão do princípio de similaridade e da ação de doses altamente diluídas de medicamentos, particularmente no sistema imunológico do hospedeiro [1].
O princípio da similitude pode operar em várias condições experimentais e reprodutíveis. Dentro da estrutura de conhecimento atual dos sistemas vivos e com técnicas modernas de investigação, é possível reformular o antigo princípio com o objetivo de construir modelos que podem ser testados em diferentes níveis, desde o nível celular até os seres humanos [1].
A seguir, citamos alguns estudos que demonstraram a ação dos medicamentos homeopáticos sobre o sistema imunológico.
No final das décadas de 80 e 90, dois grupos de pesquisadores franceses realizaram estudos sobre como os medicamentos homeopáticos poderiam influenciar a degranulação de mastócitos e basófilos. Eles utilizaram diluições homeopáticas de Apis mellifica e Lung histaminum, visto que são compostos usados frequentemente no tratamento de síndromes alérgicas, além de conhecerem a capacidade de alguns de seus componentes moleculares, como a melitina e histamina, respectivamente, na ativação de basófilos [2].
Os estudos foram baseados na hipótese de que, mesmo em diluições homeopáticas, essas substâncias podem regular basófilos ativados por doses ponderais de um agente ativo. As primeiras publicações que descrevem o efeito desses medicamentos homeopáticos demonstraram que, in vitro, a degranulação de mastócitos e basófilos induzida por componentes alergênicos, como pó e ácaros domésticos, foi estimulada quando os medicamentos foram utilizados em baixas diluições, como a 5C de Apis mellifica (diluições centesimal e decimal homeopáticas), enquanto que as diluições mais elevadas, como a 9C e 15C, apresentaram um efeito oposto.
A inibição de processos alérgicos e inflamatórios por Histaminum e Apis é particularmente interessante porque, quando liberados em doses normais para um tecido, ambos são pró-inflamatórios e têm propriedades irritantes, o que não ocorre na forma ultradiluída. Esta experiência ilustra, portanto, a aplicação do princípio da similitude em uma experiência modelo: ou seja, uma substância conhecida por estimular a inflamação em doses usuais trata o problema quando em doses ultradiluídas, confirmando que os medicamentos homeopáticos atuam sobre o sistema imunológico [2].
Outro exemplo é o estudo de Patil et al. (2009), que avaliou a atividade imunomoduladora do Rhus tox em várias diluições, através de experimentos in vivo e in vitro. Em ambos os modelos, o efeito das diluições de Rhus tox teve um efeito estimulante de acordo com a concentração. Observou-se uma estimulação potente tanto na resposta imunológica celular quanto humoral em animais tratados com Rhus tox. Os experimentos in vitro também demonstraram uma estimulação da quimiotaxia de leucócitos polimorfonucleares (PMN), que são células fagocitárias importantes nos mecanismos de imunidade natural e adquirida contra patógenos [5].
Em conclusão, os estudos acima citados mostram que medicamentos homeopáticos, em potências diferentes, podem agir sobre células da medula óssea, macrófagos, linfócitos e células PMN. Demonstram ainda que os medicamentos homeopáticos produzem modulação da função imunológica em vários níveis, além de atuar na expressão de genes que codificam receptores e outras proteínas, e estimulam macrófagos, o que foi evidenciado pelas mudanças na morfologia, aumento da quimiotaxia e produção de citocinas e espécies reativas de nitrogênio e oxigênio de células imunes. Os medicamentos homeopáticos diferiram entre si em relação ao tipo de citocinas induzidas em macrófagos, o que sugere que o tratamento homeopático tem potencial de imunomodulação em um tratamento individual específico. Adicionalmente, a variação na ação do medicamento homeopático também foi observada entre as diferentes diluições homeopáticas utilizadas, o que corrobora a diferença em sua ação observada no plano clínico [3].
Referências:
1) BELLAVITE, P. et al. Immunology and Homeopathy. 1. Historical Background. eCAM 2005;2(4)441–452.
2) BELLAVITE, P. et al. Immunology and Homeopathy. 2. Cells of the Immune System and Inflammation. eCAM 2006;3(1)13–24.
3) GUPTA, VK; MATHUR, M. Immunomodulatory effects of homoeopathic medicines: A review of pre‑clinical studies. Indian Journal of Research in Homoeopathy; Volume 12; Issue 2;April-June 2018.
4) HAHNEMANN, S. Organon da arte de curar. 6 ed.; São Paulo: GEHSP. 2013.
5) PATIL, CR. et al. Immunomodulatory activity of Toxicodendron pubescens in experimental models. Homeopathy (2009) 98, 154–159
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