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Obesidade em pets - O que devemos saber e como podemos tratar de forma holística

Foto do escritor: M.V. Claudia BarbieriM.V. Claudia Barbieri

Hoje conversaremos sobre um assunto de peso - sabia que o “excesso de fofura” do seu pet pode ser um problemão? Segundo a OMS, a obesidade em humanos triplicou desde 1975 [1] e considerando que atualmente os pets são considerados membros da família, eles também são afetados pelo estilo de vida dos seus tutores.


A obesidade é a doença mais prevalente nos cães e gatos [8], sendo estimado que entre 34% e 63% dos cães e gatos de estimação no mundo estejam obesos [5]. Embora se saiba que a obesidade influencia negativamente saúde, bem-estar e longevidade dos nossos pets [8] e que o sobrepeso reduz a expectativa de vida dos pets em até 2,5 anos [4], ela ainda não é amplamente reconhecida como um problema de saúde por muitos tutores e veterinários.


Mas como saber se o “excesso de fofura” do seu pet é obesidade? 

Cães e gatos são considerados obesos quando seu peso excede o ideal em 15-20%. Hoje se sabe que a obesidade tem várias causas que envolvem desde fatores genéticos até fatores ambientais.  Embora algumas doenças endócrinas, algumas drogas e doenças genéticas raras possam contribuir para a obesidade, ela normalmente ocorre quando há um balanço energético positivo, isto é, quando se consome mais energia do que se utiliza [4].


No que se refere à predisposição genética, observa-se uma maior frequência de sobrepeso/obesidade em algumas raças de cães como o Labrador, Cavalier King Charles Spaniel, Pastor de Shetland, Cocker Spaniel, Rottweiler, Yorkshire Terrier e Poodle. Dentre os gatos, observa-se que gatos domésticos de pelos curtos e longos, gatos de raça mista e Manx cats também apresentam maior tendência à obesidade [4].


Além da questão genética, existem outros fatores que predispõe à obesidade em cães, como por exemplo, a quantidade de exercício diário e o volume de alimentos ingerido. Fêmeas castradas também são mais propensas à obesidade, visto que ocorre uma redução dos níveis de estrogênio, que dentre suas funções, também tem papel no controle da ingestão de alimentos e no gasto energético. Por este motivo, é muito importante readequar a dieta após a realização da castração! Em gatos, os fatores predisponentes incluem frequência de alimentação, idade superior a 7 anos e machos castrados [4].


E por que excesso de peso é tão prejudicial? 

Antigamente, acreditava-se que a gordura era somente um depósito de energia metabolicamente inerte, utilizado durante jejum prolongado. Além disso, sabia-se que o acúmulo excessivo de gordura levava ao sobrepeso, problemas articulares, sobrecarga cardíaca e redução da capacidade respiratória[5]. Hoje, sabe-se que o tecido adiposo é complexo e ativo e secreta uma série de citocinas, mediadores inflamatórios e hormônios que tem ação sobre o organismo [4].


Entre as substâncias secretadas pelos adipócitos, que são as células do tecido adiposo, tem-se a leptina, hormônio conhecido por suprimir o apetite e aumentar o gasto energético, além de outras substâncias chamadas adipocinas que também têm efeitos locais e sistêmicos [4,5]. Ainda que a leptina seja um hormônio anti-obesidade e indivíduos obesos apresentem altos níveis de leptina circulantes, eles podem ser resistentes a ela. A leptina também suprime a apoptose, estimula a mitose (o que poderia explicar a maior incidência de câncer em pessoas obesas), regula as funções imunológicas e reprodutivas, modula a sensibilidade à insulina, exerce efeitos pró-inflamatórios, protrombóticos, tem papel na angiogênese (criação de novos vasos sanguíneos) e inibe a adiponectina, que é uma adipocina sintetizada e secretada por adipócitos maduros que contribui para o aumento da sensibilidade insulínica e para a diminuição das concentrações séricas de glicose. As concentrações séricas de adiponectina são diminuídas em cães e gatos obesos, provavelmente como resultado da inibição causada pela secreção de citocinas inflamatórias. Além do tecido adiposo, o sistema gastrointestinal e reprodutivos também influenciam, através dos hormônios secretados, a obesidade[4].


E quais são as conseqüências da obesidade?

Os problemas associados ao excesso de peso podem ser metabólicos e/ou mecânicos. Os primeiros podem causar efeitos locais, periféricos e centrais. Os últimos ocorrem em consequência ao aumento da massa corporal e do peso sobre os ossos, articulações, sistema cardiovascular, etc. Geralmente são lentos e progressivos e, muitas vezes, o tutor busca auxilio veterinário quando as condições já se tornaram crônicas ou estão em fase avançada [4].


A Osteoartrite, que foi tema de um artigo do mês de novembro, é um destes problemas. Isto porque temos a ação inflamatória da leptina que juntamente com aumento em outras citocinas e mediadores inflamatórios que podem degradar a cartilagem. Além disso, a ação contínua do sobrepeso sobre as articulações contribui para o desenvolvimento da osteoartrite no decorrer do tempo [4,5].


A obesidade também é fator de risco para o desenvolvimento de diversas doenças respiratórias, visto que reduz a complacência pulmonar e a capacidade torácica total. O excesso de gordura abdominal e torácica aumenta a pressão intra-abdominal e efeitos sobre a função respiratória. Ocorre uma redução principalmente do volume de ar expirado, reduzindo o fluxo de ar [2, 4].


Outra relação entre obesidade, distúrbios metabólicos e hemodinâmicos é o aumento do volume circulatório e da resistência vascular, que contribuem para a hipertensão. A obesidade abdominal está associada à doença cardíaca em cães devido à piora do relaxamento cardíaco e redução da função sistólica do ventrículo esquerdo, sendo associada à trombose venosa portal e hipóxia miocárdica [4].


Como se não bastasse, as concentrações séricas de colesterol e triglicerídeos são frequentemente aumentadas em obesos, podendo ocasionar a dislipidemia. Cães e gatos obesos e com resistência insulínica têm menor atividade lipoproteica e lipólise reduzida. Além disso, altos níveis de colesterol tem sido associados a lesões oculares enquanto que altos níveis de triglicerides, à pancreatite aguda em cães [4,5].


Temos ainda o problema do Diabetes mellitus, já que a resistência insulínica associada à obesidade é um dos fatores predisponentes para Diabetes Mellitus tipo 2, especialmente em gatos. Estudos mostram que gatos com sobrepeso têm quase 4 vezes mais probabilidade de desenvolver este tipo de diabetes [4,5].


Além disso, animais obesos produzem menos serotonina e níveis baixos de serotonina reduzem o tempo de trânsito do cólon, predispondo à constipação, frequente em gatos obesos. Além disso, o tempo de trânsito gastrointestinal mais lento pode permitir uma maior fermentação dos alimentos, alterando a microbiota intestinal [5]e trazendo desequilíbrios. Hoje se sabe que o intestino e sua microbiota estão intimamente ligados ao sistema imunológico, sendo que seu desequilíbrio pode promover distúrbios autoimunes e inflamatórios [3].


E não podemos esquecer que os hormônios e fatores de crescimento produzidos pelo tecido adiposo, citocinas e mecanismos centrais que regulam o equilíbrio energético podem contribuir para o desenvolvimento de câncer, como por exemplo, o câncer de mama, câncer de endométrio e câncer renal. A insulina e outros hormônios como o IGF-1(insulin-like growth hormone1) tem papel importante no desenvolvimento do câncer, fazendo com que a restrição calórica contribua para a inibição da carcinogênese [4].


A boa notícia é que temos a opção de abordar este problema com um tratamento relativamente simples, seguro e natural. Mas é claro que não podemos escapar da redução da ingesta calórica acompanhada de um aumento do gasto calórico [2].


O tratamento holístico da obesidade inicia com uma abordagem individualizada, visto que existem variações metabólicas individuais que devem ser consideradas, além de possíveis distúrbios a nível emocional que podem influenciar a ingestão excessiva de calorias. Inicialmente, se avalia o grau de sobrepeso ou obesidade através da combinação entre peso corporal com uma pontuação da condição corporal, conhecido como Escore de Condição Corporal (BCS) [4].


Quanto ao tratamento homeopático, não existe um medicamento específico para tratar sobrepeso e obesidade. O que se busca é o medicamento que mais se assemelhe às características do paciente, sendo bastante útil no sentido de reequilibrar o organismo, deixando o paciente mais disposto, mais ativo e reduzindo quadros de ansiedade e depressão que podem estar ligados ao quadro. O mesmo se aplica à terapia com Florais de Bach – a avaliação do comportamento, características e emoções do paciente é que irão definir a melhor combinação para auxiliar no tratamento.


No que tange aos nutracêuticos e fitoterápicos, existem algumas opções que atuam como coadjuvantes no tratamento e eu tenho tido sucesso na minha prática clínica.


O primeiro e muito conhecido por sua atividade termogênica é o gengibre (Zingiber officinale). Estudos epidemiológicos e clínicos demonstram que o gengibre e seus principais constituintes exercem efeitos benéficos contra obesidade e outros distúrbios relacionados, como diabetes e doenças cardiovasculares. Seus efeitos são mediados pela regulação do metabolismo de lipídios, supressão da digestão de carboidratos, modulação da secreção e da resposta à insulina, inibição do estresse oxidativo e aumento das atividades anti-inflamatórias, além de mecanismos anti-hiperlipidêmicos, hipotensivos e  antiateroscleróticos [10, 11].


O Modulipet®, um produto natural composto de triptofano e ácido glutâmico da beterraba também é muito útil. Ele age no reestabelecimento da comunicação neuroendócrina do tecido branco adiposo com o sistema nervoso por meio da normalização da produção de fatores de crescimento neuronais, melhorando a quebra de gorduras (lipólise) e auxiliando no processo de emagrecimento, além de apresentar efeito neuroprotetor e antioxidante.


Recentemente, entrou no mercado a oleoiletanolamida (OEA), um ácido graxo monoinsaturado derivado do ácido oleico, conhecido por ser um agonista de PPARa, que é um receptores proliferadores peroxissomais, que tem papel importante na diferenciação dos adipócitos e dos metabolismos glicídico e lipídico. A síntese endógena de OEA ocorre principalmente no intestino e sua concentração neste órgão está associada ao nível de saciedade.  Ainda que seja um análogo da anandamida, não apresenta ação direta sobre os receptores canabinoides CB1 e CB2, exercendo seus efeitos principalmente através da estimulação de aferentes do nervo vago no trato gastrointestinal, estabelecendo a comunicação do eixo intestino-cérebro e promovendo a regulação do equilíbrio energético, do catabolismo de ácidos graxos e da lipogênese [9].


Apesar de todos estes instrumentos, salientamos que o tutor é a chave para o sucesso do tratamento. Conforme estudos, 40-50% dos proprietários de pets com BCS>5 não consideraram seus animais acima do peso. Assim, é de grande importância que os tutores compreendam seu papel crucial na modificação de hábitos alimentares, redução de petiscos e guloseimas e no aumento da frequência e duração de caminhadas, passeios e brincadeiras [4].


Da mesma forma, é importante que o veterinário entenda que podem haver limitações por parte dos tutores, como por exemplo, o fato de que vários utilizam petiscos como forma de demonstrar afeto ao seu pet. Petiscos podem ser permitidos, mas deverão ser reduzidos a um máximo de 10% das calorias diárias totais ingeridas.  Assim, no tratamento do sobrepeso e obesidade, o sucesso do tratamento depende do estabelecimento de uma relação de confiança e compromisso entre tutor e veterinário, com foco na saúde do pet!


REFERÊNCIAS


2) GARCÍA-GUASCH, L. et al. Pulmonary function in obese vs non-obese cats. Journal of Feline Medicine and Surgery, Vol. 17(6) 494–499, 2015.

3) LAZAR, V. et al. Aspects of Gut Microbiota and Immune System Interactions in Infectious Diseases, Immunopathology, and Cancer. Frontiers in Immunology. V. 9. Article 1830. 2018.

4) RAMOS-PLÁ, J.J. Obesity, In: ETTINGER S. J., FELDMAN, E. C. Textbook of Veterinary Internal Medicine, 8 ed., Saunders, 2017, cap. 176.

5) WEETH, L. P. Other Risks/Possible Benefits of Obesity. Vet Clin Small Anim 46 (2016) 843–853.

6) ZHANG, A. et. al. Association of atopic dermatitis with being overweight and obese: A systematic review and metaanalysis. J Am Acad Dermatol. V. 72, N. 4. 2015.

7) BOULET, L. p. Obesity and Atopy. Clinical & Experimental Allergy, 45, 75–86, 2014.

8) KIPPERMANN, B.S., GERMAN, A.J. The Responsibility of Veterinarians to Address Companion Animal Obesity. Animals, v. 8, n. 143; 2018. doi:10.3390/ani8080143

9) Ivashkevich, D. et al. Effect of Oleoylethanolamide-Based Dietary Supplement on Systemic Inflammation in the Development of Alimentary-Induced Obesity in Mice. Nutrients 2023, 15, 4345.

10) WANG, G. et a. Beneficial effects of ginger in metabolic syndrome. Ann. N.Y. Acad. Sci.  (2017) 1–16 C_ 2017 New York Academy of Sciences

11) Attari, V.E. et al. A systematic review of the anti‐obesity and weight lowering effect of ginger (Zingiber officinale  Roscoe) and its mechanisms of action. Phytotherapy Research. 2018;32:577–585.





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